Quem visita Trancoso, na Bahia, certamente passa pela Rua do Descobrimento para chegar ao Quadrado. Do lado direito de quem vai, na esquina com a Rua do Telégrafo, tem uma livraria Nobel bem charmosa cujas donas são muito agradáveis. Uma turista como eu não consegue deixar de entrar num lugar desses, principalmente ao final da tarde e com vontade de tomar um café. Infelizmente lá não vendia nada pra beber, mas encontrei outros estimulantes.
A livraria tinha um pouquinho de tudo o que se pode ler. Eu estava de férias num lugar maravilhoso, buscando ficar em contato comigo mesma. Meus olhos percorriam as lombadas e capas dos livros atrás de algo mais zen, que combinasse com o meu espírito naquele momento. Eu estava em Trancoso, sentindo-me livre, e a futura leitura tinha de me manter no clima ou me levar para além dele.
Deparei-me com uns livros pequenos de Osho. Um em especial me pescou pelas informações da quarta capa. Chamava-se Criatividade: Liberando sua Capacidade de Invenção (Ed. Cultrix). Pronto! Eu estava diante do meu companheiro de praia. Junto, comprei Pipoca! 100 Deliciosas Maneiras de Comer Pipoca (Ed. Marco Zero) para levar de presente para a minha filha. Tudo a ver!
Possivelmente, você sabe quem foi Osho, mas vou dar um bizu pra quem não o conhece ou o conhece apenas pelo nome. No final dos anos 1950, Chandra Mohan Jain era somente um professor de filosofia na Universidade de Jabalpur, na Índia. Suas aulas polêmicas passaram a chamar a atenção das pessoas e, com o tempo, Osho (sinônimo de oceânico) abandonou a academia para ser apenas guru. Ficou conhecido por pregar a conquista da liberdade através da meditação. Atraiu quem buscava a espiritualidade sem ter de se comprometer com antigas crenças. As centenas de livros publicados levaram suas ideias para o mundo e reuniram muita gente em torno de seu movimento. Ele morreu em Purie, na Índia, após uma controversa estada no Oregon (EUA) nos anos 1980 (sobre a qual trata o recente documentário Wild Wild Country disponível no Netflix). Na placa sobre suas cinzas está escrito o que ele próprio determinou: “Osho — nunca nasceu, nunca morreu. Apenas visitou este planeta Terra entre 11 de dezembro de 1931 e 19 de janeiro de 1990.”
Eu nunca tinha lido nada dele e, na mesma noite, na pousada, comecei a me aproximar do que o guru pensava sobre criatividade. Já na primeira linha do prefácio, ele afirma que a criatividade é a maior forma de rebeldia da existência e que, para criar, é preciso livrar-se de todos os condicionamentos; do contrário, a criação será apenas uma imitação. Ao longo do livro, Osho apresenta cinco obstáculos e quatro chaves para o exercício da criatividade. Embora a leitura não tenha sido fácil, pois era redundante e, muitas vezes, o texto parecia ter sido traduzido ao pé da letra, pude entender a importância da prática da meditação para o alcance da criatividade. A natureza dá energia criativa a todos que estão libertos do ego… e assim vai…
Um dos obstáculos à criatividade seria o intelecto. Para ele, não é possível haver nenhum tipo de criatividade intelectual. Isso me chamou atenção, pois, até então, eu acreditava que precisaríamos saber para criar. Sou escritora! Ele afirma que a mente é passado, é memória, e, por isso, nunca é original. O intelecto é apenas um jogo mental, diferente da inteligência. O que ocorre nas universidades é atividade intelectual. Elas não geram Shakespeares e Dostoevskys. A inteligência é um Picasso, um Beethoven, ela é criativa. Nas palavras de Osho:
“o intelecto está na cabeça; a inteligência é um estado de vigilância do coração. […]. Quando seu coração está em harmonia com a existência, dessa harmonia nasce a criatividade. […] Criatividade significa trazer à existência aquilo que é novo; abrir caminho para que o desconhecido penetre o conhecido; abrir um canal para que o Céu venha à Terra”.
Há muita coisa sublinhada no meu livro, várias que eu não consegui assimilar na primeira leitura. Hoje, relendo os trechos destacados, voltei a me surpreender com as ideias de Osho. Espero ter despertado em você um olhar positivo sobre o seu legado. Maneiras diferentes de pensar sempre nos fazem crescer. Ser criativo é outra coisa!
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