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Hilda Hilst: uma mulher à frente de seu tempo

Homenageada da Flip (Festa Literária Internacional de Paraty de 2018), a escritora traz em sua trajetória um misto de intensidade e complexidade que já amedrontou e, hoje, encanta o público.


Não é fácil definir Hilda Hilst. Nascida em 21 de abril de 1930, em Jaú (SP), a escritora foi uma mulher à frente de seu tempo, o que consequentemente refletiu-se na obra desenvolvida por ela ao longo de quase cinquenta anos de carreira. Por meio de uma intensidade que jorrava de modo explícito em suas criações, a autora orbitou obsessivamente ao redor dos mistérios que circundam a existência humana. Vida e morte, sagrado e profano ou belo e feio foram alguns dos conceitos dicotômicos que saíram do posto simplista de meros antagonistas para serem observados em seus mínimos detalhes, semelhanças e contradições.


Textos únicos, carregados de nuances diversas, borraram o forte dualismo cartesiano e cristão que vigora em nossa sociedade contemporânea. Bastante inventiva também no âmbito da linguagem, a prosa da escritora abandonou estruturas tradicionais em prol de uma narrativa resfolegante, semelhante a um abundante fluxo de pensamento. Porém, tanta inovação e intensidade acabou fazendo com que o senso comum rotulasse a obra da autora como hermética, de difícil acesso — visão que, felizmente, começou a mudar com o passar do tempo.


Fragmento de entrevista à revista ELLE (aproximadamente 1994)

No trabalho de Hilst, o outro não é um estranho a ser observado com distanciamento. Sem polarizações e hierarquias, ela construiu um universo rico em profundidade e que não poupa ninguém da possibilidade de acessar recônditos incômodos do próprio mundo interior. Assim como o ato de escrever era realizado pela autora com cuidado e devoção, ela esperava o mesmo do público na hora da leitura. “Não quero ser lida como distração” era, inclusive, uma afirmação que costumava fazer constantemente. Contudo, outra constante era a frustração de não ser lida nem como entretenimento e nem com seriedade: muitas foram as entrevistas em que Hilst criticou o mercado editorial brasileiro e questionou a falta de um maior interesse em suas obras.


A famosa "banana" de Hilda Hilst ao mercado editorial brasileiro.

“O processo da vida que é tão complexo!”

Em meados da década de 1980, uma entrevista feita pelo jornal O Estado de S. Paulo mostrou um pouco do que estava por trás do processo criativo de Hilda Hilst: a complexidade do viver. “Quando me perguntam por que escrevo dessa forma que as pessoas não entendem, e por que é tão complexo tudo, então eu digo, mas, meu Deus, é o processo da vida que é tão complexo!”, respondeu a escritora ao veículo.


“Eu não saberia simplificar esse processo para ser mais compreensível, é o meu próprio processo dificultoso de existir que faz com que venha essa avalanche de palavras, umas assim barrocas demais, e que tudo seja misturado. Porque eu acho que a vida transborda, não existe uma xícara arrumada para conter a vida!”, exclamou.

E, falando em vida, a escritora experimentou de tudo: da boemia à reclusão. A juventude foi turbulenta, com muitas festas, amores e viagens. O comportamento avançado da artista escandalizou a alta sociedade paulistana e ela despertou paixões em poetas, escritores, empresários, atores e afins. Em meio a tanta agitação, a autora começou a sentir necessidade de ter mais tempo para si mesma e, principalmente, para a própria escrita. Com trinta e tantos anos, ela se mudou para a fazenda da família em Campinas (SP) e construiu a Casa do Sol, lugar que se tornou lar e refúgio criativo de Hilst por muitas décadas. Grande parte da obra da autora foi escrita ali, em meio a visitas de amigos, leituras enriquecedoras, natureza e cães, muitos cães, pois ela se comovia bastante com o que considerava uma espécie de vulnerabilidade canina.


Uma Hilda mais madura, com seus cães e a natureza da Casa do Sol

Foi lá que a escritora se dedicou também a experimentos inspirados no livro Telefone para o além, publicado na década de 1960 pelo sueco Friedrich Jurgenson, que afirmava ser possível registrar vozes de espíritos com gravadores.


Um raro registro de Hilda gravando os sons de seu quintal.

A casa é um importante marco na carreira da escritora e, atualmente, tornou-se o Instituto Hilda Hilst que tem o objetivo de preservar e disseminar a memória da escritora. O local está aberto a visitação e possui diversas atividades voltadas para o fortalecimento da produção cultural brasileira, inclusive residências literárias (fotos abaixo).



Premiada, multifacetada e reconhecida

A prolífica carreira da escritora resultou em mais de quarenta títulos que passeiam entre os mais diferentes estilos. Na década de 1950, o livro de poesia Presságios marcou a estreia de Hilst no universo literário. Já a obra Fluxo-Poema, de 1970, foi a primeira em forma de prosa ficcional publicada pela artista, que se dedicou também à dramaturgia teatral, escreveu crônicas em jornais, participou de coletâneas e recebeu importantes premiações literárias. Os prêmios Jabuti, Cassiano Ricardo e Anchieta, por exemplo, estão entre algumas das muitas conquistas da autora, bem como destaques concedidos pela APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte). Muitos dos livros da escritora tiveram as edições originais esgotadas e, a partir dos anos 2000, a Globo Livros reeditou sua obra completa. Em 2016, os direitos de publicação passaram a ser da Companhia das Letras. Traduções de obras dela circulam em países como Argentina, França, Itália, Portugal, Alemanha, Estados Unidos e Canadá.


Cena da peça Osmo, adaptada do conto de Hilda e protagonizada por Donizeti Mazonas com Suzan Damasceno.

Hoje em dia, Hilst ocupa o rol de grandes nomes da literatura em língua portuguesa do século XX, de acordo com a opinião da crítica especializada do Brasil e do mundo. Este ano, inclusive, a artista é a homenageada da 16a edição da Flip, que acontece entre os dias 25 e 29 de julho. Excêntrica, louca, filosófica, genial. Muitos foram os estereótipos que ela precisou encarar por ser uma mulher sem medo de ousar na vida e na própria obra. Agora, no entanto, a grandiosidade de seu legado está sendo finalmente reconhecida como fruto de um trabalho árduo, complexo e intenso, que envolve mais do que uma mulher unidimensional, mas um ser humano com diversas facetas.



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